por Sarita Oliveira
Fonte: “Am I making
too much milk?” Artigo por Diana
West, BA, consultora de amamentação certificada pela ILCA. Disponível em http://www.llli.org/faq/oversupply.html
Muitas mulheres passam por um período de grande produção de
leite após a apojadura, que pode se estender por algumas semanas. Essa grande
produção, que pode levar a ingurgitamento e a um fluxo intenso de saída de
leite, é normal, porque o corpo da mulher precisa aprender qual a demanda e
qual o padrão de mamada do bebê. Com o tempo, praticando a livre demanda e
adotando as medidas sugeridas para o ingurgitamento, a tendência é que a
produção de leite estabilize e o fluxo reduza de intensidade.
Em alguns casos, porém, a mãe pode continuar produzindo
muito leite mesmo após esse período de adaptação. Apesar de a ideia de ter
muito leite não parecer um problema, a rápida descida do leite em um peito
muito cheio pode tornar as mamadas estressantes e incômodas tanto para a mãe
quanto para o bebê. O bebê também pode ficar irritado e agitado entre as
mamadas quando a mãe tem muito leite.
Os bebês cujas mães têm muito leite podem ganhar peso mais
rápido que o esperado, mas isso não é um problema em se tratando de um bebê que
mama apenas leite materno. O que pode ser um problema é a reação do bebê ao
excesso de leite e as dificuldades com a amamentação que surgem daí.
Em outros casos, o bebê cuja mãe tem muito leite pode não
mamar tanto quanto precisa, por causa da dificuldade em lidar com o fluxo forte
de leite. Nesse caso, é muito importante avaliar o padrão de mamada para que o
bebê volte a se alimentar de forma adequada.
Quando uma mãe produz mais leite do que o bebê precisa, os
seguintes comportamentos podem ser observados no bebê:
- o bebê chora muito e fica boa parte do tempo irritado ou
inquieto;
- o bebê engasga, tosse, cospe, regurgita ou parece estar
engolindo com dificuldade durante a
mamada;
- o bebê morde ou aperta o bico do peito enquanto mama;
- o bebê arqueia o corpo, se joga pra trás, fica rígido e
pode até gritar durante a mamada;
- o bebê parece ter uma relação de amor e ódio com o peito;
- o bebê pode arrotar ou soltar pum frequentemente entre as
mamadas, com uma tendência maior a regurgitar;
- o bebê pode ter fezes verdes, líquidas e espumosas, que
saem de forma “explosiva”.
Além disso, observam-se também:
- o leite esguicha quando o bebê larga o peito,
principalmente no início da mamada;
- a mãe pode sentir os mamilos doloridos;
- as mamadas parecem verdadeiras batalhas, com o bebê
pegando e largando o peito;
- as mamadas podem parecer muito curtas;
- a mãe pode ter os seios cheios boa parte do tempo;
- a mãe pode constantemente ter ductos entupidos.
Se boa parte dessas características parece com a situação
pela qual você está passando, pode ser por você ter uma produção abundante de
leite – chamada hiperlactação ou hipergalactia - , que leva a um reflexo
intenso de ejeção de leite e a um desbalanço na composição do leite durante a
mamada. O comportamento do bebê acima descrito é uma reação a isso, mas
constantemente é confundido com cólica, intolerância a lactose, alergia a
proteína do leite de vaca, refluxo ou hipertonicidade muscular. Antes de pensar
nessas causas, a hiperlactação deve ser descartada.
Abaixo, listaremos algumas estratégias que podem ajudar
bastante nas mamadas. Felizmente, com o tempo o bebê aprende a lidar com a
hiperlactação da mãe e, na maioria dos casos, a produção de leite tende a se
ajustar ao final do terceiro mês do bebê.
Por que a
hiperlactação/hipergalactia acontece?
Há diversas razões para a produção maior de leite pela mãe.
Em alguns casos, o corpo da mãe responde muito rapidamente
ao estímulo e parece produzir muito leite desde o nascimento do bebê. Nesses
casos, a hiperlactação é uma característica da mãe, sem relação direta com a
forma como ela amamenta, mas as medidas que iremos sugerir ao longo desse texto
podem ajudar.
Em outros casos, a hiperlactação/hipergalactia resulta de um
manejo inadequado da amamentação, que estimula a produção de leite além do
desejado.
O manejo inadequado inclui as seguintes medidas, que podem
levar ao desbalanço na produção:
- Ordenhar grande quantidade de leite antes de amamentar
para tentar diminuir o fluxo e ajudar o bebê a mamar melhor. O fluxo realmente
diminui na hora, mas surge um problema crônico de produção excessiva pelo
estímulo constante.
- Mudar o bebê de lado durante a mamada antes que o próprio
bebê largue o peito. Isso acontece quando a mãe controla a duração das mamadas
ou quando ela fica mudando o bebê de peito para encontrar uma posição ou um
lado que o bebê mame de forma mais tranquila.
- Usar conchas de silicone para proteger o bico ou para não
molhar a roupa. A pressão que essa concha exerce sobre a aréola termina
esvaziando gradativamente o peito, equivalendo à ordenha. Com isso, o corpo
“entende” que há um bebê sugando continuamente – ainda que pouco – e a produção
de leite é estimulada. Além disso, essas
conchas mantêm o mamilo úmido e quente, propício à proliferação de
micro-organismos.
Estratégia para
reduzir o volume de leite
- Oferecer apenas um lado por mamada.
Repetir o mesmo lado em todas as mamadas ocorridas dentro de
um intervalo de 2 horas ajuda a regular a produção. Por exemplo, se seu bebê
mamou o peito direito às 10h da manhã, ofereça o mesmo peito todas as vezes que
ele quiser mamar até às 12h. Você não deve controlar a duração das mamadas, ou
mesmo o intervalo entre elas, mas oferecer preferencialmente o mesmo peito
dentro do intervalo de 2h, se o bebê aceitar.
Se você sentir desconforto no outro peito, faça massagem ou
ordenha manual, apenas o suficiente para aliviar o incômodo. Não ordenhe muito,
ou isso irá fazer com que seu peito produza mais leite.
Estratégias para
reduzir a intensidade do fluxo de leite
Quando o reflexo de ejeção de leite é muito intenso, o bebê
pode às vezes não conseguir dar conta. É como beber água de uma mangueira
ligada ao máximo estando deitado de barriga para cima. Além de engasgar, cuspir
e tossir, o bebê pode tentar controlar o fluxo de leite puxando a cabeça e
sugando apenas no bico, causando dor à mãe. Ou ele pode simplesmente fechar a
boca, como se estivesse mordendo, o que também costuma ser bem doloroso. Alguns
bebês choram, resmungam e jogam o corpo para trás – é a forma que eles têm de
dizer que algo precisa ser feito, que eles estão incomodados.
Veja aqui algumas medidas que você pode adotar para ajudar a
reduzir a intensidade do fluxo de leite:
- Coloque o bebê mamando em uma posição verticalizada, de
forma que ele consiga controlar a mamada, parando de sugar e mesmo largando o
peito se achar necessário. Uma posição que pode ser utilizada é a chamada
“cavaleiro”, com o bebê sentado de frente para o seio.
- Amamente reclinada, recostada ou mesmo deitada, com o bebê
por cima de você. Essas posições ajudam a reduzir a velocidade de saída do
leite porque ele precisa “subir” para sair pelo bico. Evite a posição
tradicional, sentada com o bebê deitado no seu colo, pois essa posição favorece
a descida rápida do leite e pode dificultar que o bebê controle a mamada.
- Experimente amamentar deitada de lado, com o bebê deitado
ao seu lado. Nessa posição, além de o leite não sair com tanta intensidade, o
bebê pode simplesmente deixar o excesso cair pelo canto da boca. Você pode
colocar um travesseiro ou um cobertor enrolado atrás do bebê para evitar que
ele role de costas e perca a pega.
- Alguns bebês optam por mamar pegando e largando o peito
para lidar com o fluxo de leite. Não há problema algum nisso. Deixe que ele vá
ao peito pelo tempo que quiser e quantas vezes quiser, lembrando apenas de
oferecer o mesmo peito dentro do intervalo de 2h.
- Segure o peito próximo à aréola em forma de pinça (como um
“C” mais apertado), comprimindo um pouco os ductos. Cuidado ao usar essa
medida, porque ela pode causar o entupimento dos ductos, então não é
recomendável usá-la durante toda a mamada, mas somente nos momentos em que você
perceber que o fluxo está mais intenso.
- Se o bebê começar a engasgar ou cuspir, retire-o do peito
(usando o dedo mindinho no canto da boca para desfazer o vácuo) e espere que a
intensidade do fluxo diminua. Você deve observar que o leite está saindo em
jatos: espere que os jatos parem e só então ofereça novamente o peito ao bebê.
- Procure amamentar quando seu bebê estiver calmo, antes que
ele fique com muita fome, para uma mamada mais gentil e tranquila. Bebês com
fome mamam de forma mais agitada, sugam com mais força, aumentando o fluxo de
saída do leite.
Algumas mães relatam fluxo intenso de saída do leite mesmo
quando a produção já se estabilizou. Nesses casos, o fluxo tende a não
atrapalhar: como o bebê já aprendeu a lidar com ele, não engasga mais, porque
ou larga o seio quando o fluxo sai com muita intensidade, ou para de sugar
nessas horas, ou mesmo deixa o excesso de leite escorrer pelo canto da boca,
engolindo apenas o que consegue.
Outras questões
associadas à hiperlactação
- É normal que os seios vazem leite em um quadro de
hiperlactação. Apesar de normalmente as pessoas indicarem o uso de conchas de
silicone, o GVA não recomenda seu uso, como explicamos acima. Você pode usar
uma fralda de pano ou absorventes descartáveis, tomando o cuidado de trocá-los
com frequência, sempre que perceber que estão úmidos, para evitar a
proliferação de fungos.
- Embora bebês exclusivamente amamentados não precisem ser
colocados para arrotar, o bebê de uma mãe com hiperlactação tende a engolir ar
durante a mamada. Coloque o bebê para arrotar sempre que você perceber que ele
parece incomodado e, depois que ele largar o peito e encerrar a mamada, experimente
mantê-lo na vertical por cerca de 15 ou 20 minutos. Alguns bebês precisam desse
tempo para conseguir com mais facilidade expelir o ar que possam ter engolido.
- Em alguns casos, adotar as medidas posturais sugeridas para refluxo tende a ajudar o bebê a se adaptar ao fluxo e à produção de leite
de uma mãe com hiperlactação.
- Se você tem hiperlactação, considere a possibilidade de se
tornar doadora de leite. Ao invés de usar uma fralda para aparar o leite nos
momentos de jatos mais intensos, mantenha um pote esterilizado ao seu lado para
recolher esse leite, congelar e doar ao Banco de Leite Humano de sua cidade.