Frequentemente ouvimos mães preocupadas com seu retorno ao trabalho e
como será a reação do bebê que dorme sendo embalado ou amamentado. A
verdade é que todas as crianças (e todas as mães) vivenciam um período
difícil quando precisam separar-se por causa do trabalho. Neste artigo,
seguem algumas dicas que levam em consideração o estado emocional de
ambos, mãe e filho, para lidar com essa separação.
Fatos importantes a serem considerados quando o retorno ao trabalho está próximo:
1) O desenvolvimento do ser humano no primeiro ano de vida é extraordinário, cada fase, uma necessidade.
O
bebê triplica de peso no primeiro ano, se desenvolve em todos os
aspectos (motores, cognitivos), começa a andar! Então, não se deve
comparar um bebê recém-nascido com um de 4 meses, nem um bebê de 4 meses
com um de 1 ano, por exemplos, pois serão praticamente outros bebês.
Cada
fase, uma necessidade: bebê novinho precisa muito de colo, aconchego,
contato íntimo, amamentação em livre demanda. É da natureza dos bebês
quererem colo de suas mães; na verdade esse é um ótimo hábito que foi
desenvolvido em milhares de anos de evolução, pois os bebês que não
demandavam atenção faleciam e, por isso, a seleção natural fez com que
aqueles que viviam no colo sobrevivessem e esse gene foi passado
adiante. Essas necessidades vão diminuindo conforme sua maturidade.
A
dica é aproveitar essa fase inicial, em que temos disponibilidade, e
ficar com o bebê no colo, amamentar em livre demanda, sem privar o bebê
do carinho e do colo de mãe que ele tanto precisa e tem direito.
2) Os bebês são inteligentes e têm uma capacidade enorme de adaptação e de distinção de seus cuidadores.
Eles
podem reagir totalmente diferente com a mãe e com a babá ou com a
professora do berçário (que eles sabem que não é a mãe). A capacidade e a
inteligência dos bebês de distinguir seus cuidadores permite que eles
criem modos de interação distintos com eles. Porém, é comum e esperado
que o bebê demande sempre mais da mãe, porque sabe que pode, porque
confia mais nela.
Então, o bebê criará laços afetivos com o
novo cuidador e eles se entenderão na nova forma de adormecer. E, no
final do dia e à noite, de volta aos braços da mãe, o bebê pedirá mais
carinho, mais afago, e muito provavelmente pedirá para mamar para
adormecer, mesmo que não o faça com o cuidador durante o dia. Afinal de
contas estarão com saudades e sabem que mamãe pode oferecer o peito e
curtem estar nos braços de sua referência em amor e confiança.
3) Não compensa promover separação prévia para ‘acostumar’ ou ‘preparar’ o bebê com o retorno ao trabalho.
Não
sofram por antecedência achando que têm de acostumar o bebê desde cedo a
adormecer sozinho. Bebês não têm maturidade neurológica e compreensão
para tal, então essa é uma expectativa irreal. Eles podem ter vários
sentimentos e sensações que os perturbem durante a noite e precisam de
nossa ajuda. Bebês demandam a mãe, mesmo no período noturno, e,
especialmente, se ficaram longe dela durante o dia. A criança tem em sua
mãe o referencial de segurança, estabilidade e afeto.
Um
bebê nunca fica ‘mal-acostumado’ por ter colo, embalo, acalanto, pelo
contrário, precisam disso para continuar a se desenvolver. Revisamos
isso em meu artigo anterior ‘A natureza do sono dos bebês’ (1).
Portanto, não faz sentido promover um afastamento prévio entre vocês
‘pensando no futuro’; isso só acaba gerando sofrimentos desnecessários
para ambos, mãe e bebê. Se a criança não tem colo quando pequeno, não
tem no futuro, terá quando, então? Se seu marido tem uma viagem
planejada para semana que vem, para ficar um bom tempo fora, você, para
se acostumar com a ausência dele, já vai se preparando e deixa de dormir
na mesma cama que ele, deixa de beijá-lo e de abraçá-lo? Ou faz o
oposto e trata de aproveitar ao máximo os últimos dias antes da viagem?
A
questão, portanto, não é fazer o bebê 'se desacostumar' de colo, pois
ninguém se desacostuma de uma necessidade física ou psicológica. A
questão é, sim, ajudar o bebê a criar confiança em outro cuidador.
4) "Treinar" ou condicionar o bebê a dormir sozinho vai contra sua natureza, e tem consequências.
Condicionar
o bebê a adormecer sozinho não vai ajudá-lo no próximo período de
afastamento entre vocês, pelo contrário. Para ajudá-lo, é necessário que
exista acolhimento e apego entre vocês, contínuo e íntimo, assim seu
estado emocional vai se fortalecendo, ele se sente acolhido, importante e
atendido, e vai lidar melhor com outras situações de separação.
A
maioria de planos de treinamento para bebês oferece o risco de
dessensibilização dos sinais enviados, especialmente quando há choro sem
consolo envolvido. Em outras palavras, ao invés de ajudar a descobrir o
que os sinais enviados pelo seu bebê significam, esses métodos pedem
que você os ignore. Nem você nem seu bebê aprendem nada de bom com isso.
E, com a separação durante o dia entre vocês pelo retorno ao ao
trabalho, a angústia do bebê tende a piorar (2).
Um estudo
recente mostrou que os bebês têm capacidade de prever respostas
estressantes. Eles foram divididos em dois grupos, no primeiro as mães
interagiam com eles continuamente, enquanto que no segundo bebês foram
ignorados por elas por somente dois minutos. Os níveis de cortisol,
hormônio do estresse, foram medidos após os experimentos. No dia
seguinte, o grupo que foi ignorado teve níveis de cortisol mais elevados
do que o grupo controle, provando que eles têm capacidade de antecipar o
estresse (3).
O cortisol em níveis elevados no cérebro do
bebê pode ser corrosivo. O cérebro do bebê está em pleno
desenvolvimento e a exposição desse hormônio por períodos prolongados
impede a conexão entre alguns nervos e provoca a degeneração de outros. É
possível que bebês que são submetidos a muitas noites de choro sem
consolo sofram efeitos neurológicos prejudiciais que poderão ter
implicações permanentes no desenvolvimento neurológico. Para ler um
compêndio de artigos científicos sobre o tema cortisol e efeitos no
desenvolvimento cerebral, veja a referência 4.
É preciso ter senso crítico e usar de discernimento quando recebemos
conselhos que prometem milagres. Esses métodos de condicionamento
envolvem vários riscos; além dos efeitos neurológicos, podem criar uma
distância entre você e seu bebê, e ele perde a oportunidade de construir
confiança no seu ambiente.
Algumas dicas práticas para mães preocupadas com retorno ao trabalho:
- Busca de um novo cuidador:
procure um novo cuidador que tenha disponibilidade emocional, que tenha
chance de criar um laço afetivo com seu bebê, que tenha empatia e
carinho, que o carregue no colo, não o deixe chorar e que o embale para
dormir. Não é qualquer pessoa que tem preparo emocional para cuidar,
acolher e maternar um bebê. É importante que ele se apegue ao novo
cuidador, pois é dependente por natureza e precisa desse vínculo. A
dependência natural é um fato biológico, e não resultado do excesso de
mimo materno (5).
Sendo creche, babá, parente ou outro
cuidador, lembre-se sempre da disponibilidade emocional como requisito
para cuidar de seu filho, pois não é simplesmente suprir suas
necessidades físicas, mas é também dar amor, ter interesse e prover o
afeto materno na ausência da mãe. Visite várias creches, procure locais
onde dão colo, verifique se deixam os bebês o tempo todo em cadeiras,
andadores ou outros aparatos. Se for esse o caso, é sinal que estão
desprezando a importância do acolhimento emocional no início de vida do
bebê que é tão crítico e fundamental para o resto de nossas vidas.
Para
a criança não é suficiente que lhe troquem as fraldas e lhe deem
comida. O mais necessário e nobre alimento é o afeto, acompanhado de
carinho, prazer e paz (6).
- Envolvimento de outra pessoa no ritual de sono:
encoraje o pai, por exemplo, a participar do ritual de sono do bebê
desde cedo. Ele pode dar o banho e fazer uma massagem, por exemplo.
Depois dos 3-4 meses, em média, se o bebê sempre adormece no peito,
pode-se começar a alternar maneiras de adormecer para que ele não crie
uma associação forte de sugar para dormir (7). Essa dica não é
obrigatória considerando-se que os bebês têm capacidade de distinguir
seus cuidadores (como citado no início do texto) e vai aprender a
adormecer de outra forma com quem ‘não tem peitos’. Existem crianças que
dormem mamando com suas mães em casa e na escolinha adormecem de outra
forma com as cuidadoras, sem problemas.
- Adaptação gradual:
O bebê lidará melhor com essa separação se a adaptação for gradual,
assim terá uma chance de criar um apego com o novo cuidador antes de
separações longas de sua mãe. Para que o novo cuidador crie um bom apego
com ele, criar chances de interação antes de deixá-los sozinhos é
importante.
Recomendo sempre que a mãe vá junto com o bebê
e fique com ele no novo ambiente o tempo todo, pelo menos no início.
Assim ele vai se familiarizando com o local, mas com a segurança de
ainda estar sob os cuidados da mãe. Depois a mãe pode ir se afastando um
pouco, gradualmente, enquanto dá a chance de o bebê se apegar à nova
cuidadora. Porém, não há receita pronta, é questão de observar a criança
e ter sensibilidade. A melhor qualidade que se pode esperar do cuidador
é a empatia com o bebê. Novamente, oriente que lhe dê bastante colo,
não o deixe chorar, mostre quais são os sinais de sono do bebê, deixe
que ele durma as sonecas no colo para dar um consolo afetivo na ausência
da mãe.
- E se o bebê tem ansiedade da separação?
Nos
primeiros meses, a relação mãe e filho é altamente intuitiva, primitiva
mesmo. O bebê não sabe que nasceu e acha que o corpo da mãe é
continuidade do seu e que o seio que o alimenta e lhe dá carinho e
prazer faz parte de um todo ao qual ele pertence. Então, gradualmente e
após o sexto mês é que os bebês vão se dando conta de que são outros
seres e essa percepção de individualidade fica mais clara e evidente.
Assim, progressivamente, vai se estabelecendo o desenvolvimento
psicoafetivo, motor, alimentar e cognitivo da criança (6).
Algumas idéias práticas:
Pratique separações rápidas e diárias
Durante
seus dias juntos crie oportunidades de expor seu bebê a separações
visuais breves, seguras e rápidas (brincar de esconder o rosto e logo
reaparecer é ótimo e eles adoram!). Incentive que seu bebê brinque com
um brinquedo interessante ou com outra pessoa e, quando ele estiver
feliz e distraído com o brinquedo ou com a pessoa, caminhe calma e
lentamente para outro quarto. Assobie, cante, murmure uma canção ou
fale, de modo que seu bebê saiba que você ainda está por perto, mesmo
que não possa vê-la. Pratique essas separações breves algumas vezes ao
dia numa variedade de situações diferentes.
Evite a transferência de colo para colo
É
muito comum passar o bebê do colo de um cuidador para outro. O problema é
que cria ansiedade na criança sair da segurança dos braços da mãe e ser
fisicamente transferido para os braços de outra pessoa que lhe é menos
familiar. Essa separação física é a mais extrema na mente do bebê. Para
reduzir essas sensações de ansiedade faça a mudança com seu bebê num
lugar neutro, como brincando no chão ou sentado numa cadeirinha,
cadeirão de alimentação ou bebê conforto. Peça para o cuidador sentar do
lado de seu bebê e interagir com ele, enquanto isso você fala um
‘tchau’ rápido, porém positivo, num tom feliz. Assim que você sair é um
bom momento para o cuidador pegar seu bebê no colo, e a vantagem é que o
cuidador vai ser colocado na posição de ‘salvador’ e isso pode
ajudá-los nessa relação.
Entenda a ansiedade de separação como um sinal positivo!
É
perfeitamente normal - até maravilhoso - que seu filho tenha esse bom
apego e que deseje essa proximidade com você e sua presença constante.
Parabéns! Isso é a evidência de que o laço afetivo que você criou desde o
início está seguro. Se for o caso, ignore educadamente as pessoas que
te dizem o oposto.
Relaxe em suas expectativas de independência,
isso certamente irá ajudar seu bebê a relaxar também e a ter menos
ansiedade nos momentos de separação entre vocês (8).
- Lembre-se, o acolhimento na infância tem resultado positivo na vida adulta!
Uma
pesquisa recente (9) revelou que a afeição maternal dada aos bebês
torna-os adultos mais bem preparados para enfrentar os problemas da
vida. Cientistas compararam dados das relações de afeto e atenção e
desempenho emocional de bebês de 8 meses com suas mães. Essas pessoas
foram acompanhadas e testadas aos 34 anos de idade sobre vários sintomas
emocionais. Qualquer que fosse o meio social, ficou constatado que os
bebês com bom apego emocional aos 8 meses tinham os níveis de ansiedade,
hostilidade e mal-estar mais baixos quando adultos. Isto confirma que
as experiências na primeira infância têm influências na vida adulta.
D.W. Winnicot, um pediatra famoso que depois se tornou psicanalista
diz que a capacidade de ser feliz de um ser humano depende, além de
todos outros fatores, de um tempo (a infância até os seis anos, mas
principalmente o primeiro ano de vida), e de uma pessoa (uma mulher, a
mãe). Se a mãe não está presente, outro cuidador que entenda esses
conceitos e que atenda as necessidades do bebê se faz necessário.
É
uma responsabilidade sim, de assustar! E é realmente intrigante que
pessoas tenham filhos sem saberem nada disso, sem se darem conta da
importância desse relacionamento profundo, do vínculo necessário que se
forma nesse período, e quando as mães retornam ao trabalho fora de casa
colocam cuidadores em seu lugar que somente cuidam da parte física (6).
- Não ofereça mamadeira e nem desmame seu bebê:
Com o retorno ao trabalho, muitas mães se preocupam porque os bebês não
aceitam a mamadeira e tentam todo tipo de bicos e leites artificiais
diferentes. Às vezes até mesmo o pediatra sugere o desmame. É situação
comum bebês que rejeitam veementemente a mamadeira, isso é sinal de
inteligência, pois a primeira reação da natureza é mesmo rejeitar outros
tipos de alimentação que não o seio materno.
Na verdade é
um erro acreditar que o bebê precisa de uma mamadeira quando você
retorna ao trabalho e que você deve acostumá-lo com antecedência. Se
você treiná-lo a acostumar-se com uma mamadeira, o que provavelmente
acontecerá é um desmame precoce por confusão de bicos. Sempre ouvimos
uma história ou outra de bebês que não desmamaram, mas esse risco é
grande e não há como prever, então é melhor prevenir e alimentar seu
bebê com um copinho.
Além disso, é preciso citar que, mesmo com a oferta de leite materno
ordenhado em uma mamadeira, muitos bebês rejeitam. Dr. González (10)
explica esse fenômeno:
“E a razão é que os
bebês não são bobos. Se a mãe não está em casa e a avó vem com uma
mamadeira (ou melhor ainda, com um copinho para evitar confusão de
bicos), duas coisas podem acontecer. Primeiro, se o bebê não estiver com
fome, ele provavelmente não aceitará nada. Ele vai compensar isso
quando a mãe retornar. Muitos bebês dormem a maior parte do tempo quando
estão distantes das mães, e então vão mamar à noite. A outra
possibilidade é, se o bebê estiver com fome (e especialmente se tiver
leite materno na mamadeira), ele poderá tomá-la e pronto. E ele deve
estar pensando: ‘Bem, ela não está aqui, então é isso que eu tenho que
fazer’. Mas se a mãe está em casa e o bebê pode ver e sentir o peito,
como ele vai aceitar um copinho ou mamadeira? Ele deve pensar: ‘Minha
mãe deve estar louca, ela tem o peito aqui e quer me dar essa
geringonça?’ E ele insiste: ‘É o peito ou nada!’ ”
Se
o bebê é novinho e não há possibilidade de ordenha de leite materno,
pode-se tentar uma alimentação mista, com a mãe amamentando antes e
depois do trabalho e o bebê tomando leite artificial durante o dia.
Muitas mães encontram soluções satisfatórias melhores que oferecer leite
artificial: algumas levam seus bebês para o trabalho (se o ambiente
permite), outras trabalham meio período, algumas conseguem que o bebê
seja levado a elas para serem amamentados, outras ordenham e estocam seu
leite. Se o bebê já tiver mais de seis meses de idade, pode-se planejar
que o bebê se alimente de comida na sua ausência, embora há de se ter
cautela se forem os primeiros alimentos.
A amamentação é
parte essencial da vida do bebê até 2 anos no mínimo e auxilia na
separação parcial entre mãe e filho quando ela retorna ao trabalho fora
de casa. Pode-se planejar ordenha de leite materno e continuação da
amamentação nos períodos que mãe e filhos estão juntos. O desmame junto
com o retorno ao trabalho pode ser bem traumático para o bebê (10):
“Quando você sai para o trabalho (ou quando sai
com o cachorro), o seu bebê não sabe onde você está e quanto tempo você
vai demorar. Ele ficará muito assustado e chorará como se você fosse
deixá-lo para sempre. Vai levar alguns anos até que seu bebê seja capaz
de ficar longe de você sem chorar e antes que ele entenda que a ‘mamãe
vai voltar logo’. Toda vez que você voltar, vai abraçá-lo, amamentá-lo e
o bebê pensará: ‘outro alarme falso!’. Mas se você retornar ao trabalho
e tentar desmamá-lo abruptamente e ao mesmo tempo, quando você volta do
trabalho, o bebê pede para mamar e você recusa, o que o bebê irá
pensar? ‘Ela me abandonou porque não gosta mais de mim.’ Esse é o pior
momento para o desmame.”
- Então como fica a alimentação do bebê?
Se você volta a trabalhar quando o bebê tiver menos de 1 ano, planeje
com antecedência como ordenhar (alugue ou compre uma bomba elétrica),
estocar e oferecer o leite materno para o bebê. Veja orientações na
referência 11. Use um copinho ou mamadeira-colher para oferecer o leite
ordenhado e não mamadeira. Se ele tiver mais de 1 ano, pode alimentar-se
de sólidos e mamar quando estiverem juntos.
- Tenha mente aberta para cama familiar:
Alguns bebês passam a mamar à noite com mais frequência para compensar
as mamadas perdidas durante o dia quando a mãe volta a trabalha fora.
Isso é chamado ‘amamentação em ciclo reverso’ e é um mecanismo de
sobrevivência de nossa espécie. Nesses casos, praticar cama
compartilhada e amamentar deitada pode ajudar a saciar as necessidade do
bebê ao mesmo tempo em que os hormônios da amamentação auxiliam mãe e
bebê a adormecerem novamente (12-14). O bebê fica mais tranquilo ao
saber que, mesmo passando o dia todo longe da mãe, à noite estará com
ela. A proximidade com o corpo materno sintoniza as pautas de sono do
bebê com as da mãe e regula o seu nível de excitação, temperatura
corporal, o ritmo metabólico, níveis hormonais, ritmo cardíaco,
respiração e sistema imunológico, pois o efeito anti-estresse do
estreito contato físico libera ocitocina, que fortalece o sistema
imunológico do bebê (12-15).
Nem todas as famílias adotam cama compartilhada por receio de ser
difícil conseguir que a criança durma sozinha depois. A reflexão aqui é
de que as necessidades mais intensas de proximidade se dão na primeira
infância: bebês têm necessidade de proximidade com a mãe (15) e a cama
compartilhada responderia a essas necessidades. Mais tarde, seria um
outro momento, com o bebê com outra cognição, maturidade e evolução.
Se
a criança dorme longe dos pais à noite, fica longe durante o dia e,
principalmente, se o bebê não mama mais no peito (portanto não tem o
contato íntimo da amamentação), precisa de alguma compensação afetiva e
se beneficiaria da proximidade da cama familiar. O mesmo acontece se o
bebê estiver em processo de angústia da separação, que se inicia entre
6-8 meses e vai até 2-3 anos, com altos e baixos.
Quando
os bebês sinalizam que precisam de contato corporal com os pais, mostrar
empatia, entender e acolher é excelente, pois a criança que se recusa a
dormir pode estar precisando de mais contato corporal com o pai e a
mãe. É uma necessidade primitiva da criança ter contato íntimo com a
pele do corpo de outra pessoa enquanto adormece, mas isso se choca com
todas as regras culturais que exigem que as crianças durmam sozinhas
(16).
- Procure seus direitos de licença maternidade de seis meses,
negocie com o chefe, tire férias junto com a licença, adie alguns
planos, trabalhe meio período, procure um emprego mais flexível, procure
trabalhos que possa fazer em casa.
Esses dois meses a mais fazem toda a diferença para a criança: a
amamentação exclusiva por 6 meses diminui o risco de alergias (17),
dermatite atópica (18), asma (19), infecções gastrointestinais (20),
doenças contagiosas (21), otite média, infecções respiratórias agudas,
gastroenterite, infecções urinárias, conjuntivite e candidíase oral
(22). A introdução de alimentos aos 6 meses é feita na hora ideal,
quando o bebê já tem capacidade fisiológica para assimilar os alimentos
novos (23). Muitos bebês têm reações indesejadas com a introdução de
alimentos antes dos seis meses, como prisão de ventre, refluxo, cólicas e
é claro que tudo isso atrapalha o sono. Se não tem outra solução,
invista na ordenha, estoque e oferecimento de leite materno para o bebê
até os 6 meses. Veja na referência 11 como ordenhar e estocar o leite
materno e utilize um copinho ou mamadeira-colher para oferecer ao seu
bebê. Muitas mães que trabalham podem e devem investir na amamentação
exclusiva por 6 meses e esse trabalho todo compensa.
- Lidando com a separação:
entenda a reação do bebê e mostre empatia (apesar do cansaço): sua
volta ao trabalho e afastamento é algo bem complicado para um bebê,
porque é você a mãe dele, você é insubstituível da forma que você é para
seu filho. Outros cuidadores irão criar vínculos afetivos com seu bebê,
mas a mãe tem outro peso. Entenda a amamentação em ciclo reverso como
uma forma de compensação afetiva. Entenda e acolha as necessidades do
bebê (que são simples, mas são intensas, de muito contato íntimo, colo,
peito). Esse acolhimento é essencial para o desenvolvimento de sua
autoestima no futuro.
O padrão de sono do bebê com outro cuidador pode mudar e essa mudança
pode interferir no sono noturno. O bebê cansado (caso não tire boas
sonecas na escolinha, por exemplo) está secretando mais cortisol, que
causa agitação fisiológica, irritação e dificuldades de adormecer. A
exaustão é contraproducente com o sono, pois quanto mais exausto, mais
lutará contra o sono e mais acordará à noite. Se as sonecas estão muito
curtas na escola é comum que o sono noturno também seja influenciado.
Orientar as cuidadoras a esticarem as sonecas, explicar a importância
das sonecas durarem pelo menos 1 hora para serem restauradoras, usar
algum barulho estático ao fundo para ajudar nas sonecas são atitudes que
você pode tomar.
Referências:
1- A natureza do sono dos bebês
2- William Sears, Martha Sears,
Robert Sears, James Sears. The Baby Sleep Book: The Complete Guide to a
Good Night's Rest for the Whole Family. Little, Brown and Company; 1
edition, 2005.
3- Haley DW, Cordick J, Mackrell S, Antony I, Ryan-Harrison M. Infant anticipatory stress. Biol Lett. 2010 Aug 25.
4- Sears, W. A ciência diz: choro prolongado no bebê pode ser prejudicial ao desenvolvimento cerebral- http://www.askdrsears.com/html/10/handout2.asp
5-
Bowlby, J. Attachment [Vol. 1 of Attachment and Loss]. London: Hogarth
Press; New York, Basic Books; Harmondsworth, UK: Penguin. 1982.
6-
José Martins Filho. A Criança Terceirizada. Os descaminhos das relações
familiares no mundo contemporâneo. Editora Papirus, 2007.
7- Pantley, E. Soluções para noites sem choro. Editora M Books, 2005.
8-
Pantley. E. No-Cry Separation Anxiety Solution: Gentle Ways to Make
Good-Bye Easy from Six Months to Six Years. Editora McGraw-Hill, 2010.
9-
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months predicts emotional distress in adulthood. J Epidemiol Community
Health. 2010 Jul 26.
10- Carlos González. My Child Won't Eat!: How to Prevent and Solve the Problem (La Leche League International Book). 2005.
11- Extração e Conservação do Leite Materno: http://www.aleitamento.com
12-
McKenna JJ, Why babies should never sleep alone: a review of the
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feeding, Paediatr Respir Rev. 2005 Jun;6(2):134-52.
13- McKenna JJ, Mosko SS, Richard CA. Bedsharing promotes breastfeeding. Pediatrics. 1997 Aug;100(2 Pt 1):214-9.
14-
Mosko S, Richard C, McKenna J, Drummond S, Mukai D.; Mosko S, Richard
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15- Margot Sunderland, The Science of Parenting. DK Publishing Inc. 2006.
16- Freud, Anna: Infância normal e patológica: Determinantes do Desenvolvimento, 4ª. ed., Ed. Guanabara, RJ: 1987.
17- Anderson J, Malley K, Snell R. Is 6 months still the best for
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Breastfeed Rev. 2009 Jul;17(2):23-31. Review.
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Dra. Andréia K. Mortesen, neurocientista
Publicado originalmente no Guia do Bebê, do UOL, em 9/11/2010