quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Perturbação na Amamentação

Tradução de Sandra Costa e Gabriela de O. M. da Silva do original disponível aqui
Postado originalmente no GVA (orkut)
Agradecimentos à Sara, pela revisão, e a todas as demais moderadoras da GVA :o)

É fácil imaginar que em uma mãe com experiência na amamentação, que ajudou muitas mamães a resolver seus problemas, nada mais afetaria suas experiências pessoais com respeito a amamentação.

Entretanto, há que estar alerta: o fenômeno da perturbação da amamentação pode acontecer com qualquer uma. Ter uma clara perspectiva da perturbação da amamentação pode te ajudar para entender uma mãe que está apoiando ou para você mesma, se vai amamentar em tandem.


O texto abaixo é uma adaptação de Adventures in Tandem Nursing: Breastfeeding during Pregnancy and Beyond (Aventuras na amamentação tandem: amamentar durante a gravidez e além), a mais recente publicação do La Leche League Internacional.


A perturbação da amamentação não é divertida, e a gravidez parece ser a etapa específica para que aconteça essa perturbação (afetando mais de um terço das mulheres que amamentam durante a gravidez). Algumas mulheres grávidas podem dizer com exatidão qual foi a semana que sentiram pela primeira vez a perturbação, e apesar de variar muito de mãe para mãe, geralmente é na metade da gravidez que se inicia a referida perturbação. Para muitas mulheres, a perturbação diminui no final da gravidez, enquanto que para outras este parece ser o período na qual é mais intensa.

De qualquer forma, a perturbação pode acontecer também com qualquer mãe que amamenta a uma criança grandinha, inclusive sem que exista uma nova gravidez. Quando se amamenta grávida, a perturbação parece ser motivada exclusivamente pela sucção da criança grande ou pode acontecer só quando as duas crianças mamam simultaneamente. As mães que ficam grávidas enquanto estão amamentando a dois irmãos não gêmeos parecem ser as que têm mais facilidade para que esse fenômeno aconteça. Em muitos casos, a perturbação pode não ter nada a ver ou muito pouco com a gravidez ou com a amamentação de irmãos não gêmeos.

"O maior fenômeno com o que me deparei foi muito inesperado. Me havia preparado para ter sentimentos negativos com a criança grandinha quando nascesse meu novo bebê, mas não aconteceu. Os três tivemos uma maravilhosa relação de lactância.Depois, quando meu filho tinha um ano e minha filha três, meus sentimentos mudaram. Amamentar a minha filha se transformou numa experiência terrível. Ela ainda tinha muita necessidade de mamar e eu já não podia mais. Me sentia incômoda, angustiada e enjoada quando ela estava no peito. Minhas emoções e reações eram primitivas e muito fortes". – Elisa, Nova York

O grau preciso da perturbação varia enormemente de mulher a mulher. Algumas mães descrevem um sentimento de irritação.

"É quase impossível descrever o que se sente; é como se precisasse transformar o som de pregos sendo cravados em um quadro, numa sensação física. Algumas vezes a perturbação me dava vontade de gritar com força e ao mesmo tempo dar voltas num círculo muito pequeno, várias e várias vezes" — Lisa, California.

Para algumas é mais como um arrepio.

"O melhor que posso fazer é dizer que sentia como se houvesse insetos passando por todo o meu corpo, e não pudesse sacudi-los. Começava difícil e incômodo e logo ficava insuportável. As pessoas me perguntavam: Dói muito? E eu pensava: Quem dera!! A dor eu poderia ter suportado. Isto era muito além da dor, era raríssimo e muito estranho." – Barbara, Minesota

Algumas vezes é como se estivesse tua mente contra você e o bebê.

"Sentia uma urgência poderosíssima de parar de amamentar imediatamente. Era uma reação visceral, de dentro, como uma coceira, que me deixava tensa, ansiosa, de mau humor e agitada. Era muito confuso porque não sentia dor e eu estava decidida a amamentar o meu filho tanto tempo quanto ele necessitasse. O sentimento só vinha quando Jake mamava, e logo desaparecia quando ele terminava" – Sarah, Texas

O grau da reação varia de leve (Por que já não tenho prazer em amamentar o meu filhote?) a extrema (Ah, tira esse menino daqui!!!). Alguns chamam de repulsão à amamentação. Muitas vezes, as mães não se dão conta da perturbação até que a dor do peito diminui e o desejo de separar-se continua.

A perturbação da amamentação pode vir de nossas raízes como mamíferos. A agressão materna não é pouco comum no mundo animal durante o tempo de desmame e é possível que a gravidez faça que nossos corpos pensem que é tempo de desmamar.

"Me sentia como uma cadela que eu tinha na minha infância quando esta desmamou aos seus filhotes levantando-se e caminhando cada vez que eles queriam mamar. O sentimento que tinha enquanto amamentava grávida só se pode descrever como primitivo - era tão instintivo, empurrar a filha e sair correndo para longe dela. De nenhuma maneira estava preparada para aquilo e me sentia como a pior mãe do planeta. Depois da minha experiência, fiz um questionário informal entre as líderes e outras mães de LLL que amamentaram durante a gravidez e a maioria experimentaram emoções negativas muito poderosas ao amamentar estando grávidas." – Kelly, Georgia.

As histórias das mães a respeito da perturbação nos deixam claro que este não é um reflexo da relação da mãe com o filho e nem sequer dos seus sentimentos a respeito da lactância. Parece ser um instante em que a sabedoria do corpo e a consciência pessoal são muitos úteis. É possível que formas alternativas de aconchego com o bebê possam ajudar à relação de mãe com o seu filho? Será que a mãe está cansada?

Orienta-se que a mãe trate de alimentar-se melhor, descansar mais e que passe mais tempo sozinha. Lembre-se de fazer tudo o que seja possível para cuidar de si mesma, e nada de ruim acontecerá. Uma mãe percebeu que inclusive um pequeno descanso da amamentação representa uma grande diferença.

"Percebi que levantar-me e caminhar durante alguns segundos me ajudava a encontrar um sentimento de paz." – Helen, Ontário, Canadá.


Possíveis soluções

Normalmente, o simples ato de nomear o sentimento e compreender que é algo normal e que acontece com muitas mães, por si só consegue aliviar a mesclar de negação e culpa que ocorre com as mães que sofrem da perturbação na amamentação.

A perturbação pode ser um sentimento passageiro, que se resolve espontaneamente ao término de algumas semanas. Mas isso não significa que as mães devam negar ou afastar esta sensação desagradável. No fundo, cada mulher deve pesar os prós e os contras de sua amamentação e decidir se compensa tentar superar essa perturbação ou se, ao invés disso, interpreta esse sinal como um alarme de que seu corpo está esgotado e decide iniciar o processo de desmame.

Flower recomenda buscar alternativas ao aleitamento para se relacionar com a criança, como aconchegar-se e desfrutar de carinhos sem que o bebê esteja no peito, e buscar momentos em que a mãe possa desfrutar de tempo sozinha para cuidar de si mesma.

Uma alternativa ao desmame

Encurtar as mamadas longas deve ser uma opção a se ter em conta como alternativa ao desmame.

Existem alguns truques para diminuir a duração da mamada, que são baseadas em negociação e comunicação para chegar a um acordo:

• Te darei o mamá enquanto conto até dez. O que contaremos? Mariposas ou dinossauros?

• Poderás mamar enquanto eu canto a música tal (escolher uma cantiga que a criança conheça).

• Te dou o mamá um pouquinho e depois pode tomar água no seu novo copo especial.

• Vamos apostar corrida: você mama enquanto eu conto até dez! Vamos quer quem termina primeiro?

• Vou colocar esse despertador ligado e quando ele tocar, vamos deixar o peito descansar.

• Só mais alguns golinhos.

Eu, pessoalmente (Eloisa), obtive sucesso com o que chamo de “tática do golinho”. Consiste em quando o bebê pedir para mamar, decidirmos que vamos dar sim, mas “apenas um golinho”.

No começo pode ser difícil entenderem o conceito. O que se deve fazer é colocar o bebê para mamar e assim que der a primeira engolida (“um gole”) decidimos que já acabou, porque já engoliu o leite.

Assim que estabelecemos esse sistema é preciso negociar. Houve vezes em que eu dizia “só um golinho” e ele contestava “não, vários”, e no final acabávamos tendo dois, três ou quatro, ou fazíamos uma mamada mais longa.

O que conseguimos com essa estratégia é poder comunicar a nosso filho de maneira clara e divertida quando a mamãe está disposta a oferecer uma mamada longa ou quando prefere que seja apenas “um golinho” para passar a vontade de mamar.

O papel do pai

Assim como o pai desempenha um papel fundamental na amamentação e nos cuidados com o bebê, também é importante que tome uma posição ativa no processo de desmame. Da mesma forma que não é desejável ter ao lado um pai que não faz nada além de dizer “dê-lhe uma mamadeira”, também não é agradável que o companheiro da mãe se afaste completamente do processo de desmame.

No desmame, seja ele total ou parcial, o pai deveria assumir o papel de “facilitador”. Ou seja, é o suplente que entra em campo quando a mamãe está esgotada ou não tem forças para atender às demandas do pequeno. Nesses casos o papai pode cantar, jogar, distrair ou levar o filho para passear, aproveitando também a oportunidade que esses momentos oferecem para estreitar o vínculo pai-filho.

No caso de um desmame noturno, por exemplo, seria desejável que o pai atuasse como filtro/barreira, atendendo ao chamado do filho durante a noite e tratando de acalmá-lo para que voltasse a dormir sem ter que recorrer ao seio da mãe.


Encontre mais ideias práticas para manejar a perturbação da amamentação em "Adventures in tandem nursing", por Hilary Flower.
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